O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) publicou, na última semana, uma portaria que determina o fim de qualquer desconto feito a segurados que tenham o benefício por incapacidade temporária — o antigo auxílio-doença — convertido em benefício por incapacidade permanente, antes chamado de aposentadoria por invalidez. A determinação vale para benefícios calculados com base na reforma da Previdência, promulgada em novembro de 2019.
A publicação da portaria é um desdobramento de decisão da Justiça Federal do Espírito Santo que julgou uma ação civil pública da Defensoria Pública da União (DPU). O órgão pedia, além do fim da cobrança, a obrigação de o INSS rever o caso dos segurados que receberam menos na conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez.
O problema aconteceu porque a reforma da Previdência alterou a forma de cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente, permitindo que o benefício fosse fixado num valor abaixo do auxílio-doença anterior. Antes de 2019, a renda inicial para a aposentadoria por invalidez era de 100% do salário de benefício, calculada com base na média dos 80% maiores salários de contribuição desde julho de 1994. Porém, a reforma criou uma nova fórmula de cálculo, com base em 60% do salário de benefício mais 2% para cada ano de recolhimento ao INSS, com o cálculo baseado em 100% dos salários de contribuição, sem descarte dos 20% menores. A mudança, em geral, acarretou a redução dos benefícios de pessoas que se aposentaram por invalidez a partir de novembro de 2019.
Para piorar, segundo especialistas, o INSS passou a convocar pessoas para perícias revisionais e a realizar a conversão dos benefícios temporários em aposentadorias permanentes, reduzindo a renda desses aposentados. Também começou a realizar descontos em folha de valores que os segurados receberam a mais durante o período de análise da conversão (veja o exemplo abaixo).
Cumprimento de decisão
Assinada pelo diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão do INSS, André Paulo Felix Fidelis, e o procurador-geral Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho, a portaria determina o cumprimento da decisão e deixa claro que outro documento será publicado acerca das revisões de benefícios que se farão necessárias.
— A portaria nacional, ao determinar desde já a suspensão de cobranças abusivas e impedir que novas sejam realizadas, corrige apenas parcialmente uma brutal injustiça que ainda vem sendo praticada contra milhares de pessoas com incapacidade permanente que, além de sofrerem redução de suas verbas alimentares, ainda vinham sofrendo cobranças retroativas sobre seus benefícios já reduzidos, de modo a inviabilizar a sobrevivência — diz o defensor público federal Ricardo Giori.
Entenda
Mudança de cálculo
Imagine um segurado que estava recebendo um auxílio por incapacidade temporária (auxílio-doença) no valor de R$ 3 mil desde 1º de janeiro de 2023. Em 1º de junho de 2023, a perícia médica reconheceu que a invalidez dele começou em 1º de março de 2023 e transformou o antigo benefício por incapacidade temporária em uma aposentadoria por incapacidade permanente (aposentadoria por invalidez), com data de início em 1º de março de 2023. Como esse segurado tinha apenas 20 anos de contribuição, o valor da aposentadoria passou a ser de R$ 1.800 (60% de R$ 3 mil).
Convocações
O problema é que o INSS passou a convocar pessoas para perícias revisionais e a realizar de ofício a conversão dos benefícios temporários em aposentadorias permanentes.
Resultado
Ainda no exemplo citado, pelas regras, o aposentado por invalidez do INSS passou a ter um débito com o instituto correspondente a diferença entre 1º de março e 31 de maio de 2023 — período em que o INSS promoveu a análise do caso — no valor de R$ 1.200 x 3 meses = R$ 3.600.
Fim do desconto
Essa diferença vinha sendo cobrada pelo INSS, o que foi suspenso a partir da ação civil coletiva movida pela Defensoria Pública da União em favor dos segurados.
Veja quem pode ser beneficiado
Especialista em Direito Previdenciário e sócia do escritório Vargas Farias, a advogada Jeanne Vargas avalia que a mudança provocada pela reforma da Previdência foi uma alteração grave no valor dos benefícios:
— É uma injustiça e uma total contradição um benefício que tem o objetivo de proteger uma situação mais grave ter um valor inferior a um benefício de risco social mais leve. Estamos diante de uma desproporcionalidade. Na prática, o valor da aposentadoria por invalidez raramente supera o valor de um auxílio-doença porque exige que tanto o homem quanto a mulher tenham mais tempo de contribuição para superar o coeficiente de 91% já garantido pelo auxílio-doença.
Data de referência
De acordo com Jeanne Vargas, devem ser beneficiados pela mudança feita agora pelo INSS — em respeito à decisão judicial — todos os segurados que tiveram a aposentadoria por invalidez, precedida por auxílio-doença, concedida a partir de 13 de novembro de 2019, quando a reforma da Previdência passou a vigorar.
Segundo a Defensoria Pública da União, dados fornecidos pelo INSS no curso do processo dão conta de que mais de 250 mil benefícios por incapacidade temporária ativos, com início anterior a 13 de novembro 2019 podem sofrer os efeitos da decisão, com 88 mil benefícios revistos imediatamente para o cumprimento da sentença judicial.
Fonte: Jornal Extra
Deixe um comentário